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quarta-feira, 27 de agosto de 2008

DA PUTA DA VAIDADE: DE SAMORA MACHEL A MÁRIO SOARES (SÓ-ARES)

"Em circunstancias que descreverei noutros capítulos, eu teria a grande honra de conhecer em 1983 o então presidente de Moçambique, Samora Machel. Era injustamente conhecido em Portugal pelas «anedotas» racistas que o transformavam sempre no «intérprete vítima», ignorando totalmente os seus grandes dotes humanos. Acontece que Samora Machel gostava de contar ele mesmo «histórias» sobre os portugueses e às vezes, com grande sentido de fair play, transformava-se a si próprio na «vítima» da anedota. Uma noite, numa conversa que teve comigo em Maputo, satisfaria a minha curiosidade sobre pormenores da transição dizendo-me, meio a sério meio a brincar, que, quando assumiu o poder pela primeira vez, uma das suas primeiras medidas foi só sair à rua com pelo menos o dobro dos motards da escolta policial que o antigo governador colonial utilizava. Para a população — diria perante o meu ar de divertido espanto — era um sinal de que o novo presidente moçambicano era duas vezes mais importante que o ex-govemador colonial! Ora vem esta maravilhosa história a propósito da imagem que, no nosso país, se «vendeu» com êxito à empobrecida população, farta do seu longo isolamento internacional. A ideia, a partir do momento que se sabe que os portugueses querem seguir um destino comum ao dos seus congéneres europeus, de que quem tinha amigos ricos na Europa era rei! Chegar-se-iam mesmo a descrever relações internacionais sem o menor sentido de modéstia e das proporções, tendo o líder socialista afirmado até ser «evidentemente... amigo pessoal do Schmidt, do Willy Brandt, do Callaghan, do Olof Palme, do Yoergensen, do Kreisky, do Mitterrand, etc. Posso pegar em qualquer momento no telefone e falar com eles»-. Mesmo que fosse verdade em 1979 e que, com excepção de Mitterrand, Mário Soares conseguisse falar com qualquer desses «amigos pessoais» numa linguagem comum, esta afirmação visava o mesmo objectivo dos motards de Samora Machel. A realidade era contudo muito diferente, sobretudo, antes do 25 de Abril de 1974".


Mateus, R. (1996). Contos Proibidos. Memórias de um PS Desconhecido. Lisboa: Dom Quixote, p. 39

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